terça-feira, 10 de março de 2015

A razão na Filosofia contemporânea



A razão histórica

Conforme vimos no capítulo anterior, nem todos os filósofos aceitaram a solução
hegeliana para as dificuldades criadas para a razão com o conflito entre inatismo
e empirismo.
É o caso do filósofo alemão Edmund Husserl, criador da fenomenologia (que
descreve as estruturas da consciência), que manteve o inatismo, mas com as
contribuições trazidas pelo kantismo. Em outras palavras, a fenomenologia
considera a razão uma estrutura da consciência (como Kant), mas cujos
conteúdos são produzidos por ela mesma, independentemente da experiência
(diferentemente do que dissera Kant).
O que chamamos de “mundo” ou “realidade”, diz Husserl, não é um conjunto ou
um sistema de coisas e pessoas, animais e vegetais. O mundo ou a realidade é um
conjunto de significações ou de sentidos que são produzidos pela consciência ou
pela razão. A razão é “doadora do sentido ” e ela “constitui a realidade” enquanto
sistemas de significações que dependem da estrutura da própria consciência.
As significações não são pessoais, psicológicas, sociais, mas universais e
necessárias. Elas são as essências, isto é, o sentido impessoal, intemporal,
universal e necessário de toda a realidade, que só existe para a consciência e pela
consciência. A razão é razão subjetiva que cria o mundo como racionalidade
objetiva. Isto é, o mundo tem sentido objetivo porque a razão lhe dá sentido.
Assim, por exemplo, a razão não estuda os conteúdos psicológicos de minha vida
pessoal, mas pergunta: O que é a vida psíquica? O que são e como são a
memória, a imaginação, a sensação, a percepção?
A pergunta “O que é?” não se refere a uma descrição dos processos mentais e
físicos que nos fazem lembrar, imaginar, sentir ou perceber. Essa pergunta se
refere à descrição do sentido da memória, da imaginação, da sensação, da
percepção, isto é, se refere à essência delas, independentemente de nossas
experiências psicológicas pessoais. A fenomenologia não indaga, por exemplo,
se uma certa idéia ou uma certa opinião são causadas pela vida em sociedade,
mas pergunta: O que é o social? O que é a sociedade? As respostas a essas
perguntas formam as significações ou essências e são elas o conteúdo que a
própria razão oferece a si mesma para dar sentido à realidade.
A fenomenologia afasta-se, portanto, da solução hegeliana, pois não admite que
as formas e os conteúdos da razão mudem no tempo e com o tempo. Elas se
enriquecem e se ampliam no tempo, mas não se transformam por causa do
tempo.

Fonte: Chaui, Marilena. Convite à filosofia, Unidade 2, Capítulo 5.
 





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