terça-feira, 21 de abril de 2015

Diferentes teorias sobre a verdade



Existem diferentes concepções filosóficas sobre a natureza do conhecimento
verdadeiro, dependendo de qual das três idéias originais da verdade predomine
no pensamento de um ou de alguns filósofos.
Assim, quando predomina a aletheia, considera-se que a verdade está nas
próprias coisas ou na própria realidade e o conhecimento verdadeiro é a
percepção intelectual e racional dessa verdade. A marca do conhecimento
verdadeiro é a evidência, isto é, a visão intelectual e racional da realidade tal
como é em si mesma e alcançada pelas operações de nossa razão ou de nosso
intelecto. Uma idéia é verdadeira quando corresponde à coisa que é seu
conteúdo e que existe fora de nosso espírito ou de nosso pensamento. A teoria da
evidência e da correspondência afirma que o critério da verdade é a adequação
do nosso intelecto à coisa, ou da coisa ao nosso intelecto.
Quando predomina a veritas, considera-se que a verdade depende do rigor e da
precisão na criação e no uso de regras de linguagem, que devem exprimir, ao
mesmo tempo, nosso pensamento ou nossas idéias e os acontecimentos ou fatos
exteriores a nós e que nossas idéias relatam ou narram em nossa mente.
Agora, não se diz que uma coisa é verdadeira porque corresponde a uma
realidade externa, mas se diz que ela corresponde à realidade externa porque é
verdadeira. O critério da verdade é dado pela coerência interna ou pela
coerência lógica das idéias e das cadeias de idéias que formam um raciocínio,
coerência que depende da obediência às regras e leis dos enunciados corretos. A
marca do verdadeiro é a validade lógica de seus argumentos.
Finalmente, quando predomina a emunah, considera-se que a verdade depende de
um acordo ou de um pacto de confiança entre os pesquisadores, que definem um
conjunto de convenções universais sobre o conhecimento verdadeiro e que
devem sempre ser respeitadas por todos. A verdade se funda, portanto, no consenso e na confiança recíproca entre os membros de uma comunidade de
pesquisadores e estudiosos.
O consenso se estabelece baseado em três princípios que serão respeitados por
todos:
1. que somos seres racionais e nosso pensamento obedece aos quatro princípios
da razão (identidade, não-contradição, terceiro-excluído e razão suficiente ou
causalidade);
2. que somos seres dotados de linguagem e que ela funciona segundo regras
lógicas convencionadas e aceitas por uma comunidade;
3. que os resultados de uma investigação devem ser submetidos à discussão e
avaliação pelos membros da comunidade de investigadores que lhe atribuirão ou
não o valor de verdade.
Existe ainda uma quarta teoria da verdade que se distingue das anteriores porque
define o conhecimento verdadeiro por um critério que não é teórico e sim prático.
Trata-se da teoria pragmática, para a qual um conhecimento é verdadeiro por
seus resultados e suas aplicações práticas, sendo verificado pela experimentação
e pela experiência. A marca do verdadeiro é a verificabilidade dos resultados.
Essa concepção da verdade está muito próxima da teoria da correspondência
entre coisa e idéia (aletheia), entre realidade e pensamento, que julga que o
resultado prático, na maioria das vezes, é conseguido porque o conhecimento
alcançou as próprias coisas e pode agir sobre elas.
Em contrapartida, a teoria da convenção ou do consenso (emunah) está mais
próxima da teoria da coerência interna (veritas), pois as convenções ou consensos
verdadeiros costumam ser baseados em princípios e argumentos lingüísticos e
lógicos, princípios e argumentos da linguagem, do discurso e da comunicação.
Na primeira teoria (aletheia/correspondência), as coisas e as idéias são
consideradas verdadeiras ou falsas; na segunda (veritas/coerência) e na terceira
(emunah/consenso), os enunciados, os argumentos e as idéias é que são julgados
verdadeiros ou falsos; na quarta (pragmática), são os resultados que recebem a
denominação de verdadeiros ou falsos.
Na primeira e na quarta teoria, a verdade é o acordo entre o pensamento e a
realidade. Na segunda e na terceira teoria, a verdade é o acordo do pensamento e
da linguagem consigo mesmos, a partir de regras e princípios que o pensamento e
a linguagem deram a si mesmos, em conformidade com sua natureza própria, que
é a mesma para todos os seres humanos (ou definida como a mesma para todos
por um consenso).

Fonte: Chaui, Marilena. Convite à filosofia, Unidade 3, Capítulo 3. (pág. 124 a 125) 

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