domingo, 4 de janeiro de 2015

Infinito e finito



O século XIX prosseguiu uma tradição filosófica que veio desde a Antigüidade e
que foi muito alimentada pelo pensamento cristão. Nessa tradição, o mais
importante sempre foi a idéia do infinito, isto é, da Natureza eterna (dos gregos),
do Deus eterno (dos cristãos), do desenvolvimento pleno e total da História ou do
tempo como totalização de todos os seus momentos ou suas etapas. Prevalecia a
idéia de todo ou de totalidade, da qual os humanos fazem parte e na qual os
humanos participam.
No entanto, a Filosofia do século XX tendeu a dar maior importância ao finito,
isto é, ao que surge e desaparece, ao que tem fronteiras e limites. Esse interesse
pelo finito aparece, por exemplo, numa corrente filosófica (entre os anos 30 e 50)
chamada existencialismo e que definiu o humano ou o homem como “um ser
para a morte”, isto é, um ser que sabe que termina e que precisa encontrar em si
mesmo o sentido de sua existência.
Para a maioria dos existencialistas, dois eram os modos privilegiados de o
homem aceitar e enfrentar sua finitude: através das artes e através da ação
político-revolucionária. Nessas formas excepcionais da atividade, os humanos
seriam capazes de dar sentido à brevidade e finitude de suas vidas.
Um outro exemplo do interesse pela finitude aparece no que se costuma chamar
de filosofia da diferença, isto é, naquela filosofia que se interessa menos pelas
semelhanças e identidades e muito mais pela singularidade e particularidade.
É assim, por exemplo, que tal filosofia, inspirando-se nos trabalhos dos
antropólogos, interessa-se pela diversidade, pluralidade, singularidade das
diferentes culturas, em lugar de voltar-se para a idéia de uma cultura universal,
que foi, no século XIX, uma das imagens do infinito, isto é, de uma totalidade
que conteria dentro de si, como suas partes ou seus momentos, as diferentes
culturas singulares.
Enfim, um outro exemplo de interesse pela finitude aparece quando a Filosofia,
em vez de buscar uma ciência universal que conteria dentro de si todas as
ciências particulares, interessa-se pela multiplicidade e pela diferença entre as
ciências, pelos limites de cada uma delas e sobretudo por seus impasses e
problemas insolúveis.

Fonte: Chaui, Marilena. Convite à filosofia, Capítulo 5.

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